A alma dos meus canivetes
- Alex
- 23 de set. de 2017
- 3 min de leitura
Não precisamos ser colecionadores para gostar de canivetes. Tão pouco é necessário ser aventureiro para precisar de um. Eu gosto de canivetes. Tenho alguns daquela marca suíça famosa e outros tantos que fui comprando por aí, em shoppings e camelôs. Ok, não são alguns...Tenho um monte de canivetes.
Todos foram direto das lojas para o repouso eterno em gavetas esquecidas aqui de casa. Conversando com um amigo colecionador, não soube explicar-lhe o motivo de eu 'enjoar' tão rápido dos meus canivetes. Foi quando ele disse que aquelas canivetes caíram no esquecimento porque não tinham personalidade. Não tinham alma. Personalidade? Canivete com alma? Que papo é esse? _Jung explica! - afirmou o amigo, citando a teoria de Carl Jung no livro O Homem e Seus Símbolos, que dá conta de que a alma dos objetos está no seu significado e etc e tal. Que papo cabeçudo, pensei. Encerrei a discussão convicto de que ele estava viajando na maionese ou tirando uma com a minha cara.
Segui enchendo gavetas de 'xing lings', até encontrar, por acaso, o site do Canivetes da Roça, que - de prima - chamou a atenção com a seguinte frase: "Canivetes de fabricação Nacional. Clássicos brasileiros, típicos do sertão." Comprei dois. Um modelo mineiro tradicional e um estilo pica fumo. Os dois em aço carbono. Fui bem atendido, o site funciona bem e a encomenda chegou rapidinho. Bacana! Mas a diferença dessa compra começou assim que abri a embalagem do Sedex.
Os canivetes estavam embrulhados com cuidado, em plásticos e jornais, as lâminas bem protegidas e besuntadas com óleo de máquina. Um cartãozinho despretensioso e preenchido a mão certificava a aquisição.
Ao desembrulhar as peças libertei da caixa o cheirinho bom da madeira dos cabos. Percorri com os dedos as costuras das bainhas comprovando que eram verdadeiras. O trabalho em relevo do couro legitimava a rusticidade esperada, típica do sertão, conforme a promessa do site. Deu para sentir direitinho que mãos trabalharam ali. Mãos que modelaram, lixaram, poliram, costuraram. Enfim, fizeram muito mais do que simplesmente encaixar peças prontas. O desenho tradicional caipira despertou memórias afetivas. Lembrei do sítio de minha avó. Do aroma contínuo do fogão a lenha. Da brisa morna dos finais de tarde. Dos meus tios, com seus canivetes, alisando palhas secas para fazer cigarro enquanto contavam causos na varanda. Foi uma conexão imediata. Ali entendi o meu amigo. Sim, canivete tem personalidade. Canivete tem alma, sim.
E os que comprei no site da Canivetes da Roça não foram, e não irão, para a gaveta com os demais. Afora o lado emocional, a lâmina dura e o fio resistente do aço carbono me ajudam em muitas coisas todos os dias. Meus canivetes abrem cartas, apertam parafusos, cortam frutas, raspam, fatiam, martelam e seguem firmes e fortes. São lâminas para toda obra. O único ponto de atenção - além dos cuidados com a manutenção do aço carbono - fica por conta das molas dos canivetes novos. São muito duras e potentes. Se por um lado é bom porque a potência da mola mantém a lâmina firme no cabo, por outro requer cautela e paciência na hora de abrir. Os meus Canivetes da Roça já estão mais 'macios', mas quando eram novos dei uma talhada bem feia no dedo por falta de atenção. Mas, como dizia o tio Bastião enquanto picava o seu fuminho de rolo e dava um gole na cachaça: "O bicho é brabo, mas é bão! " E você? Também tem um canivete com alma?
Conta pra gente! Quanto mais Brasil Feito a Mão, melhor!

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